quinta-feira, 17 de março de 2011

Bicho tem alma?


Somente as pessoas que convivem com animais, especialmente cães, poderão dar credibilidade ao que vou narrar. Tudo passaria despercebido, não fosse a reincidência dos acontecimentos. Se não convivesse a vida toda com animais dentre eles papagaios, caturritas, periquitos, cães e todo o tipo de avezinhas que preenchem os céus de meu quintal, honrando-me com suas encantadoras visitas, vêm beber de minha água ou retirar o néctar de minhas flores, daria o dito pelo não dito. Ou, no mínimo, creditaria o estigma de falacioso ao narrador de alguma história similar.

Desde que o meu marido decidiu voltar a ter, em casa, um cachorro a quem daria atenção e muito carinho, rendida, acatei-lhe a decisão. Posso afirmar com as mãos mais juntas e em reza de que não me arrependi, embora, às vezes, tenha perdido a paciência com alguma travessura. Os animaizinhos que já tivemos, cada um e a seu tempo, trasmitiram  muitas alegrias e propiciaram momentos difíceis de serem apagados da memória. Pensando neles, volverei as minhas reminiscências, tendo como foco inspirador um cão boxer, o Sheik, presente de um amigo de um vizinho, o Leonardo.

Quando chegou aqui em casa, entre nós ocorreu o tão decantado amor à primeira vista. O bichinho me olhou, acariciei-lhe a inquieta cabecinha e os dois caímos nas intrincadas redes da afetividade. De imediato, o bichinho aceitou-me, provavelmente, acreditando ser eu a sua mãe. Reticente, não queria aceitá-lo como filho, visto que, tanto eu como o meu marido, sempre fizemos questão de estabelecer os limites do afeto. Cão é um animal. Não temos o direito e não devemos tratá-lo como gente. Portanto, filho meu ele não era. Muito menos, eu, mãe dele. Deveria cedo fazê-lo entender que eu era a dona dele. Sem querer, às vezes, dizia-lhe vem com a mamãe! Ao que era, de pronto, repreendida pelo dono dele.

Encantada com a ternura do cãozinho, confeccionei roupinhas, cobertas e   colchão que, além de ortopédico, recebeu a proteção de um belo e macio tecido. Reformei a casa que pertencera à Jade, uma cadela linda da raça Fila e que morreu depois de longa e sofrida enfermidade. Como que para demonstrar o reconhecimento pelas oferendas, o cachorrinho lambia os pertences e a casa. Agia como se os beijasse. Para nós, o César Augusto e eu,  que a tudo assistíamos,  eram beijos mesmo, visto que nos olhava e repetia o gesto.

Foram tantos os momentos vividos junto ao Sheik, tão marcantes e ternas são as lembranças que tenho dele, que me senti impelida a lhes contar momentos de extremada ternura. Deter-me-ei em duas passagens para justificar o título deste texto. A primeira é comovente. A segunda relatarei em outra oportunidade. A esta, deixarei ao leitor o livre arbítrio para julgar em que grau poderá enquadrá-la: afetividade ou inteligência.

Como sempre, pelo menos a cada dois meses, a minha filha e o meu genro vinham passar um fim de semana aqui, em casa. Ainda sem filhos, o deslocamento do casal tornava-se mais fácil. O que justificava o apego deles em relação ao pai-sogro e a mim. Depois que nasceu a sua garotinha, o afeto se deslocou um pouco, o que é perfeitamente justificável. Também agimos assim em relação aos nossos pais.

Ocorreu na hora da despedida, num domingo, à tarde, o que vou relatar. Os meus três filhos sempre adoraram animais, assim como eu e o meu marido, conforme já afirmei. Todavia, a que mais despudoradamente demonstrava o imenso amor por bichos era a minha menina. Se eu permitisse, no quarto do casal, dormiria ainda  o cachorro enquanto permanecessem aqui.

Depois de muitos beijos, abraços e choradeiras, resultado das despedidas entre nós, Daniella despediu-se também do Sheik. O que se passou teria derretido o coração até das pessoas mais insensíveis. Feitos os tradicionais agrados, despediu-se dele com abraços e palavras repletas de ternura. Minha filha, chorando, virou-lhe as costas. Para surpresa e comoção de todos, o cachorro abraçou-a pela cintura e, em desespero, empurrou-a de volta a casa.

Fazia isso com tanta força e, tendo como aliada a fragilidade dela, que chorava ainda com mais intensidade, tentava não deixá-la partir. Abraçado a ela, não a largava, como se estivesse lhe implorando  que não fosse embora. Tocados pela emoção gerada pela despedida, ficamos paralisados diante de tão espontânea e desinteressada demonstração de amor.

Para dar nova e mais emocionante dimensão à cena, uma chuva fininha começou a cair. Depois, em forma de lágrimas, foi molhando tudo. Era como se o céu estivesse chorando conosco também. Depois disso, convenci-me de que cão tem uma inexplicável espécie de alma e sabe,  tanto quanto os  humanos, demonstrar o mais escancarado dos amores.

7 comentários:

  1. Bom dia maravilhosa!

    Lindo texto e tu ainda dizes que são textinhos, ah quem me dera escrever assim!

    Senti toda a emoção de lê-lo que minha imaginção ficou tão fértil quanto terra virgem e viajei no tempo para viver a cena.

    Mil bjus
    Adejane M Gudolle

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  2. Bom dia, linda lindinha!
    As histórias que relato contém a mais autêntica das verdades, porque tenho como censor o Decésari. Caso dê uma "viajada", critica e refaço o texto. Ter um marido crítico é bom porque aprendi a dar a real e verídica dimensão ao enredo.Tudo o que escrevo, passa pelo crivo dele. Se acha bom, publico. O mesmo acontece com os texto que envio a ZH. Se gosta, pode correr ao jornal que o artigo aparece lá.
    Ah! Estou esperando um texto teu. Tu escreves bem.
    Beijinhos e beijões.

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  3. Djeine! Faltou um S em textos. Desconsidera o erro.

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  4. Oi mana!

    Não ando muito inspirada ultimamente para escrever um texto de qualidade. Estou muito absorvida a arrumar minha coisas para a mudança de vida e cidade.

    Minha nossa! Sou uma pessoa sozinha, mas juntei tanta trelha que avolumaram minha mudança, 3 caixas grandes de roupas de inverno, 2 malas de roupas de outono e 2 de verão. A Laura sempre me abastece com roupas. Pena que o pé dela é pequeno, na mesma proporção que tenho muitas roupas tenho poucos sapatos, que ironia ahahahah! E estou bem mal de sapatos. Quem manda ter pé grande (37)?
    Viajei para outro rumo que não o do texto em si.
    Tão logo ajeite a minha nova vida, escrevê-lo-ei, com certeza!
    Beijão
    Deja

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  5. Bom dia, minha querida!
    Estás quem nem tartaruga, carregando a casa nas costas?
    Quanto às malas, imagino a quantidade de roupas que tens para embalar. Continuas usando uma a cada dia e sem repetir nenhuma durante o ano? Quanto a mim,abandonei um pouco esse jeito tão nosso de não repetir roupa, porque perdi o prazer que tinha em passá-las. Hoje, no dia a dia, uso calças jeans e casacos ou blusas que dispensem ferro. Estou "light" em todos os sentidos.
    Desliga-te quanto ao texto. Se, um dia, a musa das palavras encarnar em ti...

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  6. Simplesmente estou as lágrimas...nunca na minha vida vou esquecer esse dia e é por esses e outros motivos e nunca vou conseguir chamar o querido do "atentadinho" por esse nome...nossa....bjks!!

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  7. Daniellinha!
    Cena lindíssima e inesquecível mesmo!
    Apesar do Sheik II não ser tão dócil como o outro Sheik, o primeiro, este tem os seus encantos. Mas que é terrível, não se pode negar, apesar de um pouquinho mais calmo. A verdade é que não mais vivo sem ele. Sem a mesma paixão que tinha pelo outro, mas...esforço-me.

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