Ouvindo a rádio local que anunciava vagas em residências para empregadas domésticas, lembrei-me de uma história engraçada que me aconteceu. Sempre mantive uma relação de estreita amizade com as moças que empregava para realizarem as atividades do lar. A maioria era oriunda de famílias bem constituídas e, quase sempre, jovenzinhas indicadas por uma cunhada a quem adorava, a Ironda.
Por serem escolhidas dentre as relações campesinas dela, sempre me apresentava moças excelentes. Por isso, foram bem poucas, porque trabalharam em minha casa de oito a onze anos. Só saíam para casar ou quando arrumavam um emprego melhor, que podia ser no comércio, no serviço público, como autônomas ou em escritórios. Com elas, mantenho, até hoje, notórios laços de reconhecimento e muito carinho. Seguidamente as recebo em casa com todas as honrarias a que têm direito.
Uma delas, embora tenha trabalhado comigo não mais que seis meses, deixou marcas inesquecíveis. Excelente cozinheira que era, fazia “vistas grossas” aos estragos que causava na casa e nos objetos. Tinha em mente aquele surrado bordão: “por causa do santo, beija-se o altar”. Quebrava objetos de estimação ou de relativo valor e eu me calava. Assim íamos. A ela, cozinhando cada vez melhor, mesmo que não deixasse de brinde as sobras, tudo perdoava.
Quem trabalha fora sabe muito bem a importância que se reveste o ato de se retornar a casa e encontrá-la com cheiro de limpeza e sabores de doces, bolos, pizzas e toda a sorte de iguarias. Arrumava uma mesa como ninguém. Decorava lindamente as comidas. Sabia como e onde colocar talheres, guardanapos, copos e taças. Doméstica de luxo! Não fosse o seu lado desastrado, certamente que por aqui estaria até hoje, se quisesse.
O que realmente quero narrar e me alastrei na lembrança da jovem, é um fato muito engraçado. Tudo o que se perguntava a ela, a resposta indefectível surgia espontaneamente: “-Acho que não sei!” Se lhe indagasse “o que vai ter para o almoço, hoje?”, a resposta pontuava-se com o acho que não sei. Ia trabalhar feliz, porque apresentaria, na mesa, uma gostosa e linda refeição. Às vezes, sentia-me incomodada com aquele acho que não sei, no entanto fui me acostumando. Aliás, meu marido e filhos, também.
A história que motivou estes escritos ocorreu numa manhã de frio e muita chuva. Chegando em casa, louca para chimarrear, (a garota fazia um mate como o mais notável dos gaúchos e cujo segredo guardava a sete chaves), fui ligar o rádio portátil que mantínhamos sobre a geladeira. Antes que consumasse o ato, Rosa Maria se sai com esta: “Acho que a rádia parou de falar.” Perguntei por quê. Ela: Acho que não sei! Ela, de novo: Acho que sei, mas não sei!
No lugar de perder a paciência com ela, comecei a rir, sendo seguida no riso por ela.
Eu: Como não sabes o que aconteceu, menina, se estavas só tu e o rádio em casa?
A resposta dela veio numa avalanche: Acho que o rádio caiu de cima da geladeira.
Insistente, mais uma vez, perguntei: Como achas que caiu? Ela: Acho que não sei! De novo eu insisti: Rádio não cai sozinho, como caiu?
Não me contive com a resposta dela: Acho que não sei, mas acho que fui eu!
Fazer o quê diante de tão santa ingenuidade (ou esperteza). Dei o ocorrido como findo, afirmando que compraria outro rádio desde que ela cuidasse melhor dele.
O motivo pelo qual perdi a excelente cozinheira, creio ser bastante engraçado e misterioso também. Não pude saber como, mas descobriu que, longe dela, só a chamávamos de “achota" (pelo "achismo" e por ser bem gordinha). Sentiu-se ofendida. Confundiu "achota" com palavrão ou com "a chata".
Até hoje carrego a dúvida se esse foi o real motivo ou se recebera alguma proposta salarial mais tentadora.
Naquele tempo, os patrões é que estipulavam o valor a ser pago pelos serviços domésticos. A aceitação dos valores dependia de quanto a doméstica se sentisse valorizada ou não. Eram despedidas mesmo sem justa causa, ou abandonavam o emprego com ou sem motivo convincente. Não havia as leis trabalhistas que as protegem hoje. Nem aos empregadores.
Uma delas, embora tenha trabalhado comigo não mais que seis meses, deixou marcas inesquecíveis. Excelente cozinheira que era, fazia “vistas grossas” aos estragos que causava na casa e nos objetos. Tinha em mente aquele surrado bordão: “por causa do santo, beija-se o altar”. Quebrava objetos de estimação ou de relativo valor e eu me calava. Assim íamos. A ela, cozinhando cada vez melhor, mesmo que não deixasse de brinde as sobras, tudo perdoava.
Quem trabalha fora sabe muito bem a importância que se reveste o ato de se retornar a casa e encontrá-la com cheiro de limpeza e sabores de doces, bolos, pizzas e toda a sorte de iguarias. Arrumava uma mesa como ninguém. Decorava lindamente as comidas. Sabia como e onde colocar talheres, guardanapos, copos e taças. Doméstica de luxo! Não fosse o seu lado desastrado, certamente que por aqui estaria até hoje, se quisesse.
O que realmente quero narrar e me alastrei na lembrança da jovem, é um fato muito engraçado. Tudo o que se perguntava a ela, a resposta indefectível surgia espontaneamente: “-Acho que não sei!” Se lhe indagasse “o que vai ter para o almoço, hoje?”, a resposta pontuava-se com o acho que não sei. Ia trabalhar feliz, porque apresentaria, na mesa, uma gostosa e linda refeição. Às vezes, sentia-me incomodada com aquele acho que não sei, no entanto fui me acostumando. Aliás, meu marido e filhos, também.
A história que motivou estes escritos ocorreu numa manhã de frio e muita chuva. Chegando em casa, louca para chimarrear, (a garota fazia um mate como o mais notável dos gaúchos e cujo segredo guardava a sete chaves), fui ligar o rádio portátil que mantínhamos sobre a geladeira. Antes que consumasse o ato, Rosa Maria se sai com esta: “Acho que a rádia parou de falar.” Perguntei por quê. Ela: Acho que não sei! Ela, de novo: Acho que sei, mas não sei!
No lugar de perder a paciência com ela, comecei a rir, sendo seguida no riso por ela.
Eu: Como não sabes o que aconteceu, menina, se estavas só tu e o rádio em casa?
A resposta dela veio numa avalanche: Acho que o rádio caiu de cima da geladeira.
Insistente, mais uma vez, perguntei: Como achas que caiu? Ela: Acho que não sei! De novo eu insisti: Rádio não cai sozinho, como caiu?
Não me contive com a resposta dela: Acho que não sei, mas acho que fui eu!
Fazer o quê diante de tão santa ingenuidade (ou esperteza). Dei o ocorrido como findo, afirmando que compraria outro rádio desde que ela cuidasse melhor dele.
O motivo pelo qual perdi a excelente cozinheira, creio ser bastante engraçado e misterioso também. Não pude saber como, mas descobriu que, longe dela, só a chamávamos de “achota" (pelo "achismo" e por ser bem gordinha). Sentiu-se ofendida. Confundiu "achota" com palavrão ou com "a chata".
Até hoje carrego a dúvida se esse foi o real motivo ou se recebera alguma proposta salarial mais tentadora.
Naquele tempo, os patrões é que estipulavam o valor a ser pago pelos serviços domésticos. A aceitação dos valores dependia de quanto a doméstica se sentisse valorizada ou não. Eram despedidas mesmo sem justa causa, ou abandonavam o emprego com ou sem motivo convincente. Não havia as leis trabalhistas que as protegem hoje. Nem aos empregadores.
Amiga, obrigado por atender o meu pedido de voltar às "histórias que vivi". Eu e minha mulher adoramos. Por não termos filhos, fizemos a nossa catarse através do que você escreve. Agradecemos por tal.
ResponderExcluirAbçs.
João Lucas
Minha mana loka de especial!
ResponderExcluirAdoro tuas estórias e da forma como as conta fazes como que nossa imaginação fique centrada no teu texto e, isso nos prende até o fim.
A tua narrativa daria bons frutos se tivéssemos grana para investir num livro ou até mesmo uma peça de teatro!
Quem sabe pense em escrever peças teatrais rende mais que livro, o investimento poderá vir do fundo estadual de cultura?
A produtora de eventos tu já tens, ahahahaha.
Atores encontraremos!
Pense nisso enquanto eu te digo até amanhã - plagiando Sergio Jockmann.
Adejane M Gudolle
Olá, João Lucas!
ResponderExcluirPedido de um amigo fiel como tu é sempre uma ordem e que faço questão de acatar.
Um abração em ti e na esposinha.
Irmazinha.
ResponderExcluirNas aulas de redação, o que orientava os alunos era que deviam escrever, enfeitando de tal sorte o texto, mesmo que, para manter cativo o leitor, valessem-se de uma "mentirinha". E lascava Fernando Pessoa neles. Esses versos, dentre inúmeros, eram tiro e queda. A piazada escrevia redações lindíssimas. Repriso o poeta:
"O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente
E os que lêem o que escreve
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm
E assim nas calhas da roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama o coração."
Ah! Quanto a escrever livros, não tenho cacife para tanto. Os testinhos por mim escritos são meras porcarias que refletem ou não o meu estado de espírito.
ResponderExcluirDizem os mais críticos que só escreve muito bem e bonito se o sofrimento pontua a vida do escriba. Como sou uma pessoa quase que 24h feliz, escrever belamente nunca será realidade.