terça-feira, 2 de novembro de 2010

Não complique!


Adoro fotografias, mas uma das que mais me impressionou nos últimos tempos foi aquela em que o fotógrafo Kevin Carter, que ficou famoso tanto pelo impacto causado pela imagem como por ter  se suicidado um ano depois de tê-la clicado. A temática era uma criança africana, à beira da morte, consumida pela fome e, rondando, na iminência do desenlace fatal, um urubu esperava consumir a carniça, com que via a criancinha.

Todavia a que me inspirou a escrever esta crônica foram dois  outros motivos: o primeiro, o retrato feito por Mary McCartney, em que o motivo inspirador é o lado vazio deixado pela mãe, Linda, na cama que compartilhava com o marido Paul e pai da fotógrafa em questão. A foto foi feita um ano após a morte da genitora. Somente uma filha amorosa e profissional sensível pensaria em fotografar uma cena como esta: travesseiro envolto por fronha lindamente bordada, ainda rota, denunciando as marcas deixadas pela cabeça da usuária dele. Os lençóis, emaranhados, revelam a presença-ausência de um delicado corpo de mulher. Tudo, exatamente, como aconteceu no último suspiro da mãe.

Além desse foco inspirador, o outro foi a dica profissional legada por Linda MacCartney, fotógrafa também, falecida em 1997. Na dica passada à filha na hora de fotografar, a mãe recomendava: “Não complique”. E tinha inteira razão. Na vida, quanto mais elaboradas tentamos fazer as coisas ou buscamos caminhos complicados para trilhar, mais difícil se torna a empreitada.

Se as pessoas mirassem o espontâneo ou a simplicidade como meta a ser seguida em suas existências,  o ato de ser feliz estaria bem mais acessível a elas. Claro que o mero ato de não complicar não é suficiente para melhor a  vida de alguém, mas pode abrandá-la, torná-la mais aceitável.


Para que complicar, quando tudo  se resume em nascer, crescer, desenvolver-se e não se pode eclipsar a mais inexorável das verdades: morrer? Simples assim. Nada é definitivo. As lágrimas de ontem, sabe-se, podem se transformar nos sorrisos do agora. Não se deve esquecer que a alegria, a felicidade, o bem estar, os amores não são definitivos. Portanto, para que sofrer por antecipação como um número expressivo de homens e mulheres o fazem?

Não se pode olvidar também que aquilo que parece irremediável, pode se metamorfosear em lição de vida, exemplos a serem seguidos, arrependimentos e perdões, porque, depois de violento temporal e do milagre do aparecimento do arco íris, o sol romperá, radioso, descomplicado, tão simples como o respirar e o acordar todos os dias.

Meu bom amigo! Minha amiga querida!

Descompliquem-se e terão mais chances de ser tocados pelo condão mágico da fada madrinha chamada Felicidade ou, pelo menos, persegui-la é bem possível.

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