segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O encantamento de se viver


Existe coisa mais gostosa do que acordar com o cocoricó de um galo, ou com carícia de um filho dizendo mamãe? Ou sentir o cheiro de café se esparramando pelos corredores da casa e lhe dando um bom dia olfativo? Ou despertar com o plim plim da chuva batendo na  janela como se querendo dizer bom dia?

Há algo mais sensacional, no inverno, do que tomar um banho numa banheira grandona, cheia de  água quentinha e, depois, vestir uma camisola de pelúcia, cheirando a sabão em pó e lavanda? Ou no verão, lamber, devagarzinho, um sorvete de morango, incrustado de flocos de coco e lambuzado de calda de chocolate?

Ou ver os amores-perfeitos exibindo-se coloridos, querendo saltar pela janela para enfeitar a gola da blusa branca? Ou, à tardinha, abrir o forno e, de lá, retirar o pão quentinho, rasgar-lhe as entranhas com faca afiada e enchê-lo de manteiga caseira e com sal?

Abrir a janela do quarto, cedinho, e ser saudada pelo  cachorro que, de tão faceiro, sorri com a cauda a ponto de fazê-la quase um leque? Ou arrumar, com esmero, a casa para receber os afetos? Deitar sobre a mesa as iguarias mais gostosas em que todos, antes, a comem com os olhos? Depois, sem pressa, perceber que os comensais saboreiam o alimento como se fosse um cerimonial sagrado?

Existe algo mais reconfortante do que discar um número ao telefone e, do outro lado, ouvir um alegre alô e , como uma mágica, se saber que o interlocutor está sorrindo, feliz com o telefonema? Há encantamento maior do que encontrar velhas cartas de amigos ou de amor e relê-las sorrindo e chorando ao relembrar um tempo tão lindo que passou, mas que fora encarcerado nas páginas amareladas da missiva?

Pode haver coisa mais linda do que se saber que, em algum lugar, enquanto o sol se põe, alguém sabe que existimos e faz questão de dizer que nos ama? Ou pensar em quem tanto se estima e, inexplicavelmente, aparece ou se corporifica ao telefone? Pode haver algo tão simples e tão magistral como correr na chuva, fazendo gol com a água retida nas poças d’ água e sentir a roupa colada ao corpo como uma doce carícia?

Há maior encantamento do que dançar de rosto colado e ouvir um sussurrado te amo e sentir um frenesi percorrendo todo o corpo? Ou ouvir, do médico, que tudo está bem e que se vai viver por muitos anos? Quem já não se emocionou com um lindo discurso de formatura ou com a noiva entrando na igreja sorrindo, nervosa tentando reter as lágrimas?
 
Há circunstância mais  fenomenal do que ver o mar pela primeira vez, dar-se conta de sua grandeza, de todos os mistérios que ele encerra e, à tardinha, enxergar o sol navegando sobre as ondas para se esconder num lugar do não sei onde?

A vida é linda, mas o mais lindo mesmo é ouvir a palavra vovó, articulada com tanta ternura pela neta amada que até se aceita as marcas delegadas pelo tempo.


* Essa crônica escrevi, pensando em todos os meus amores e nas pessoas especiais que me enviam e-mails tão lindos, fazendo-me reiterar o afeto através das palavras.



2 comentários:

  1. Arlete,mesmo na correria,não poderia me permitir ficar indiferente ao teu belo artigo,que tenho certeza que em poucos dias estarei relendo na ZH.Parabéns

    ResponderExcluir
  2. Obrigada, amigo querido. Às vezes, penso que estou poerdendo tempo aqui. Então tu fazes um lindo e motivador comentário, e eu volto a me animar e vou me desnudando através da palavra. (Até vou mandar um novo artigo para ZH. Vai que publicam!)
    Ah! Se não publicarem,postarei aqui e tu me dirás se foi mera ilusão minha de que era um bom texto.

    ResponderExcluir