Durante uma de minhas viagens a Santa Catarina para proferir várias palestras, dirigi-me a Porto Alegre, depois a São Leopoldo para, de lá, deslocar-me, de ônibus, ao destino final. Já na Rodoviária, deparei com a precariedade do veículo, no qual empreenderia a longa viagem e o aspecto rude das pessoas, que viajariam comigo. Não contei mais que três homens. Mulher? Apenas eu. De pronto, tratei de dirigir-me ao lugar marcado em minha passagem. Ao se dirigirem, também, aos seus assentos, cada um dos viajantes, trabalhadores rurais pelo jeito e pelas vestes, ao passarem por mim, sentia-lhes um cheiro estranho e desagradável. O tradicional "ganharás o pão com o suor de teu rosto", no caso, das axilas. Torcia, portanto, para que nenhum deles ocupasse o assento ao meu lado. Não por preconceito, mas por anseio de, ao enfrentar a longa viagem, pudesse fazê-la em silêncio para ir rememorando o como me desempenharia durante as palestras, ou melhor, procuraria, literalmente, fazer a lição de casa.
Iniciado o trajeto, o veículo parava em todas as cidadezinhas onde desciam e subiam novos viajantes. Para sorte minha, por um tempo considerável, viajei sozinha. Depois o ônibus foi enchendo de novos agricultores e, para minha surpresa, numa das paradas, subiu um senhor bem apessoado, como diria a minha avó. Como era o único lugar vago, sentou-se ao meu lado. Encolhi-me ainda mais em meu canto, fingindo que dormia. (Detesto entabular conversas nessas ocasiões. A proximidade com o companheiro de viagem, sentado lado a lado, parece-me uma invasão de privacidade, por isso, toda a cautela nunca é suficiente para manter um significativo silêncio.)
Numa curva perigosa, aproveitando-se do iminente perigo, o cidadão iniciou a tão temida conversa. Entabulou um verdadeiro monólogo. Contou-me fatos pessoais, da família, do trabalho. Mostrou-me fotos da única filha, linda aos olhos dele e aos meus, exibiu a imagem da casa, uma verdadeira mansão, do sítio, o refúgio como chamava a residência da praia e fotos por onde andara. Um homem rico, portanto.
O homem falava sem parar. Eu continuava a escutá-lo sem proferir uma única palavra. Talvez imagine que eu seja muda, pensei, mas nada me demoveria de apenas ouvi-lo. Nunca fui dada a contar fatos sobre a minha vida, não o faria, naquele momento, para um desconhecido. Como já mencionei, tudo parecia tranquilo até que, chegada a noite, o cidadão começou a me importunar. De início, com insinuações sutis. Depois, como se fosse enfrentar uma batalha, investiu contra mim, na certeza de que se sairia vitorioso.
Foi, justo naquele momento, que me dei conta da importância de uma argolinha de ouro no dedo anelar da mão esquerda. Instintivamente, lembrei-me de minha saudosa sogra que não admitia eu não usar o símbolo de posse como já mencionei (o “pertence a”). Exatamente, naquela hora, também prometi a mim mesma que compraria uma aliança e dela não mais me afastaria. Jurei ainda que, por onde fosse, carregaria um álbum de fotos com marido, filhos, genro, netos, cachorro, casa, automóvel, enfim, tudo o que denunciasse eu ser uma mulher casada, respeitável e muito feliz.
Se cumpri o prometido? Em partes. Ganhei uma aliança nova de meu marido (claro que lhe pedi o presente inusitado há pouco tempo e depois que vivenciei outro incidente relacionado ao não uso de aliança. Cautelosa, não contei o sucedido a ninguém. Estou revelando esta saia justa por meio deste blog porque foi o jeito que encontrei para, valendo-me deste espaço tão liberal e democrático, revelar as alegrias, as pequenas mazelas e os desconfortos por que já passei.) Como a minha filha Daniella ficou surpresa e curiosa porque, depois de longos anos, comecei a usar aliança, a partir desta leitura, passará a entender o real motivo.
Sei que ainda estão curiosos para melhor entender a relação entre saia justa, distanciamento, aliança matrimonial e as bolhas da postagem. Ainda não captaram a simbologia e o entrosamento existente entre eles? Fornecer-lhes-ei detalhes para maior clareza e dar um final mais compreensível a este texto.
Saia justa, porque o pseudo cavalheiro entendeu o meu silêncio, ou a paciência em apenas ouvi-lo, o meu distanciamento, como um “quem cala, consente”, por conseguinte, alguém a quem poderia investir na certeza da conquista almejada. O não uso de aliança, indicativo do “eu sou casada”, deu margens para que o homem começasse a imaginar coisas, introduzindo falsas e maldosas expectativas a meu respeito em uma cabeça, que acreditei, estava repleta apenas de bolhas de sabão, suscetíveis de explodirem a qualquer momento, quero dizer, o sujeito era o mais autêntico cabeça oca, um cordeiro em pele de lobo, plagiando aqui o notável Esopo.
Em tempo: estou providenciando um álbum de fotografias contendo todos os meus afetos mais fotos de cama, mesa e roupa lavada para citar apenas essas metáforas e não deixar nenhum resquício de dúvida quanto à minha seriedade, desde que não ocupem muito espaço em minha bolsa de viagem. Com o maior descaramento, puxarei as fotos e as esfregarei na cara de algum engraçadinho... "Mexam com que tá quieto!"
Oi, amiga, como anunciei ontem, vim ler o fim do saia justa. Deveria ter denunciado o "maledeto" ao motorista que arrancaria o palhaço do onibus.
ResponderExcluirAbçs.
João Lucas
Oi mana!
ResponderExcluirCheguei a imaginar que tinhas trocado o ônibus e ido parar na cidade errada, é bem típico, mas assédio foi mais difícil de imaginar.
Realmente acontece mesmo nas longas viagens quando fui para São Paulo aconteceu com uma passageira que quase matou o sujeito de pancada, foi hilário! Ainda bem que te livraste numa boa, pobre próximo carente louco por uma bonitona como tu, ficou na mão, ahahahah
Bjus lindo dia para ti,
Adejane
Arlete, saia justa 2 - Numa das vindas daquela namorada até minha cidade, a levei para uma boate,onde dançamos e bebemos socialmente é claro.Eu querendo impressionar a moça não media as consequencias "financeiras".Na hora de ir embora,por não ter carro,chamei um taxi,larguei a moça no local onde estava hospedada(parente) e segui mais duas quadras e pedi para o motorista parar,não tinha dinheiro para pagar a corrida,tive que deixar o meu relógio em garantia e marcar um local para pagar o motorista e reaver o relógio que era de estimação.Podes rir a vontade.
ResponderExcluirAgora entendi tuuuudo...a aliança nova, as fotos que tanto queria que te enviasse...as bolhas...nossa...confesso que me deu uma sensação estranha, tipo - meu pai vai ler isso, ou - eu não queria ler isso...sei e sempre soube que és uma bela mulher, mas alguem te "cantando" nunca imaginei...vou ser mais incentivadora da aliança e das fotos é claro, a partir de agora.
ResponderExcluirMil beijocas!!
Nossa! Viram o que acuriosidade gera nas pessoas? Começarei pelo meu bom e fiel amigo João Lucas: Vês só, por ser educada passei mpor uma situação constrangedorae deveria ter feito o que me aconselhaste.
ResponderExcluirUm abraço.
Djeine queridíssima:
ResponderExcluirSabe, irmãzinha, nem quando era jovem passei por situações desse tipo. Vês só como certas pessoas não sabem onde "metem o nariz". Como eu encerrei o texto, às vezes, um demônio pode ter cara de anjo.
Um beijão
Meu querido amigo:
ResponderExcluirO que viveste é, realmente, uma saia justíssima. Ainda, se a garota era bonita, pode ser que tenha valido o vexame. Se era um "tribufu", merecias que o taxista te levasse para a cadeia. Ahahahah! Mas é isso, meu amigo, quando se é jovem se faz cada uma... O bom disso tudo é que se tem coisas engraçadas (ou tristes) como essa para se contar e dar boas gargalhadas com o inusitado dos fatos. Outra: é o que dá quando se quer impressionar alguém. Coisas da juventude, mas que é engraçado, Ah! se é.
Um forte abraço
Filhinha amada:
ResponderExcluirQuando me perguntaste o porquê do uso da aliança depois de tanto tempo, fiquei com vontade de te contar. Sabes, esse fato me torturou por todo esse tempo. Sentia-me suja, como se eu tivesse dado motivos para aquele desgraçado me importunar. Depois que escrevi sobre aquele infeliz acidente, senti-me aliviada como se o compartilhamento daquela triste e nojenta situação tivesse deixado de ser um drama e se convertido em comédia.(como escrevi, este blog está servindo para eu exorcizar os meus demônios. Só lamento que te magoei, percebi-te constrangida, todavia, cada pessoa busca as suas catarses a seu jeito. Este foi o que encontrei para me sentir em paz comigo mesma
Dani,pega leve.
ResponderExcluirPessorinha querida, é assim mesmo. Os filhos acham que são os donos exclusivos de nossa vida e de nossas vontades. Se tudo sai bem estão sempre conosco . Se alguma coisa não sai como eles querem aí é um horror. Eles enchem a boca dizendo "Mãe, é tudo igual. Só muda o endereço" Verdade, só que eles são iguais aos outros filhos também. Uns mais compreensivos, outros ci[úmentos e alguns "não tão nem aí!"
ResponderExcluirViu? Aprendi contigo a me expressar bonito. Espero que não haja erros e que tu gostes do que escrevi.
Um beijão
Carmem Lígia
Eu de novo. Além de ler os textos que tu colocas aqui, tu percebeste que leio os comentários também? Adoro ler o que escrevem sobre ti e os teus textos. Bjs.
ResponderExcluirA mesma