quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Os dois tipos de idealistas

Depois que descobri Stephen Kanitz, nunca mais deixei de, por falta de um bom texto meu, arrastar um artigo escrito por ele. Preocupado com o que diz e voltado para quem o lê, escreve com a intenção de levar o leitor a refletir e revisar posicionamentos. Dá um banho de sabedoria!

O texto de hoje é Os dois tipos de idealistas


"Há dois tipos de idealistas no mundo. O primeiro grupo é composto de pessoas que querem ver um mundo melhor, acabar com as desigualdades, injustiças sociais e assim por diante.

Gastam tempo como voluntários, doam dinheiro para entidades beneficentes e se engajam em campanhas das mais diversas. Os americanos e europeus são campeões nessa área com os Ted Turners, Packards e Georges Soros da vida doando bilhões de dólares.

O segundo grupo de idealistas é aquele composto de pessoas que querem fazer a mesma coisa, mas que nunca pagam a conta. São os chamados "idealistas-com-o-dinheiro-dos-outros".

Com o nosso dinheiro, para ser mais preciso. Você não participa das decisões, eles raramente prestam contas de para onde vai todo o dinheiro e os resultados estão aí, nossos problemas sociais se agravando.

Recentemente, assisti ao Seminário Contra a Pobreza, em que o governador Cristovam Buarque expôs suas idéias sobre como erradicar a pobreza. O plano era pagar às crianças pobres para que pudessem estudar e a conta seria de 30 bilhões de reais. Fiquei curioso em saber se o plano era consistente e quem iria pagar a conta caso houvesse inconsistência.

Não tive que esperar nem dois minutos pela resposta. O segundo debatedor, Luiz Inácio Lula da Silva, fuzilou uma inconsistência do plano: aluno com fome não aprende. Salvou-nos 30 bilhões de reais, ou acrescentou mais 6 bilhões de despesas em alimentação nos planos de Buarque. Ao longo do dia, outros três políticos e professores apresentaram soluções diversas para a pobreza do Brasil e no final da tarde a conta para o contribuinte brasileiro já chegava, pelos meus cálculos, a 120 bilhões de reais. É ilimitado o idealismo que se pode ter com o dinheiro dos outros.

O que é mais curioso é que nenhum dos planos apresentados abordou a geração de empregos, a única solução eficaz, a longo prazo, para o problema da pobreza do Brasil.

Há quem diga que a sociedade brasileira nunca fez filantropia com seu próprio dinheiro. Não somos uma nação cidadã. Por isso, o Estado tem de ocupar esse espaço vazio. Um argumento forte e infelizmente apropriado. Mas a alternativa também não deu certo, pois entregamos 30% do PIB ao Estado e muito pouco acaba sendo gasto no social.

A maior parte das despesas é com a aposentadoria de funcionários públicos, com salários públicos e com juros sobre a dívida pública. Não é à toa que 84% das pessoas acham que o governo poderia melhorar na área social (vide pesquisa no site filantropia.org).

Com a falência do Estado, surgiu recentemente o Terceiro Setor, que com muito menos dinheiro, fruto de doações e trabalho voluntário do setor privado (o segundo setor), está resolvendo os problemas com muito mais eficiência do que o governo (o primeiro setor). Mas ainda representa menos que 1% do PIB.

Como passar do estágio atual de paternalismo e idealismo do Estado, que consome 40% dos recursos, para uma sociedade civil organizada e preocupada com o social? Obviamente por etapas, a primeira sendo a volta da dedutibilidade do Imposto de Renda de todas as doações a entidades beneficentes atuantes e competentes do país, como já houve no passado.

Lentamente, faríamos filantropia com nosso dinheiro, criaríamos uma sociedade civil solidária e sem burocracia no meio. Assim, resolveríamos os problemas sociais com maior rapidez, com menor custo, e os contribuintes seriam os próprios fiscalizadores das entidades. As cartas de agradecimento iriam para quem as merecesse e não para políticos e burocratas que repassam o nosso dinheiro.

Então, geraríamos o círculo virtuoso da filantropia. Pequenos donativos no início e curtas cartas de agradecimento. Maiores donativos com o decorrer do tempo e com placas de reconhecimento em salas de aula e hospitais, por exemplo.


Finalmente, teríamos enormes donativos, de heranças e fundações, com edifícios inteiros batizados com o nome do doador, como a maioria das faculdades e hospitais americanos. É só começar.

*Stephen Kanitz é administrador por Harvard (
www.kanitz.com.br)

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