terça-feira, 2 de março de 2010

Sonhar ainda é preciso...

Como ando sem tempo para escrever bons textos, passarei a reproduzir alguns editoriais meus que foram publicados no jornal gaúcho Zero Hora. Aproveito para relembrar a um amigo anônimo como, ao longo dos anos, venho tentando, embora, timidamente, fazer a minha parte na conscientização dos brasileiros...

Um país como o Brasil, detentor de todas as condições para se igualar às mais poderosas nações do mundo tanto por sua extensão territorial como pelas potencialidades entranhadas em seu solo ou pelas possibilidades produtivas do povo, parece estigmatizado pelos lindos e fatídicos versos, orgulhosamente cantados em seu hino, para permanecer “deitado eternamente em berço esplêndido”. Jamais imaginaria o autor que um despertar atemporal evidenciar-se-ia de forma tão demorada e contundente. Ao vaticinar que os filhos “de mãe gentil“ não temem “a própria morte”, forjou, nos brasileiros, a conformidade, agrilhoou-os na aceitação de um destino sem futuro promissor para si e para seus descendentes.

Só não lhes despertou a força imperiosa de não fugirem à luta na contenção de batalhas que eclodem todos os dias, na rebelião em presídios, no fratricídio nas ruas, na corrupção incontida, na canalhice dos políticos, na ingerência dos governantes, no descaso com a saúde de sua gente, na exiguidade de empregos, no descuido com a segurança, no descomprometimento com a educação ao miserabilizar seus professores através de salários tão baixos.


Parece que o povo deixou-se abater por tantos descalabros e, ao aceitá-los como vaticínio inevitável, perdeu a capacidade de evidenciar seu inconformismo. Os intelectuais, em passado muito próximo, que concretizavam, através da arte, sua revolta, agora se omitem. Abandonada, a população acovardou-se pela falta de lideranças, num silêncio constrangedor, prostrou-se mansamente, como se o flagelo da imoralidade que se alastra pela nação, não fosse a sua saga e a sua ruína. Nem a derrota, na Copa do Mundo, de uma seleção que se mostrou improdutiva e frágil, embora prévia e exaustivamente festejada, fez com que os brasileiros despertassem da letárgica acomodação em que estavam aprisionados.

Espera-se que, na Semana da Pátria, reacenda-se a esperança, exorcize-se a inércia e resgate-se a força do povo que gravita em país tão bonito e que, ao despertar soberano, parta em busca do futuro em conformidade com sua grandeza; da malfadada noite que adormeceu seus habitantes nos últimos anos, possa surgir uma nova realidade pela força do voto consciente, numa tentativa desesperada na crença do banimento da imoralidade avassaladora da pátria, no surgimento de líderes autênticos, de políticos comprometidos com o povo e com o renascer desse gigante que não pode continuar adormecido.

O que não pode acontecer é o entorpecimento de idealismos, porque a desesperança está contaminando parcela significativa de pessoas esclarecidas, cujas vozes, ao perderem a ressonância, aprofundam, cada vez mais, o vazio da indiferença que se alastra entre a parcela menos esclarecida da sociedade. Em contexto assim, sonhar ainda é preciso.



>Publicado dia 04 de setembro de 2006, Jornal Zero Hora, página 19.

Para refletir:

"Se tivesse uma bandeira, ela seria vermelha e verde. Vermelha de cólera pelas desigualdades; verde, de esperança." (Lygia Fagundes Telles)


4 comentários:

  1. Arlete,me recordo quando li este artigo,telefonei para te parabenizar,fiquei super feliz quando vi o teu nome na zero hora.Mais uma vez parabéns.

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  2. Amigo:
    Fiquei surpresa com essa revelação. Jamais imaginei que a pessoa entusiasmada e amável que se dissera meu ex-aluno eras tu. (Não é à toa que, entre amigos e familiares, corre a brincadeira de que a minha melhor amiga poderia "compartilhar" a mesma cama com meu marido e eu nem perceberia.Traduzinho: desligada , mas "tapada",imbecil? Ah! isso, não!))As coisas acontecem ante o "meu nariz" e não lhes sinto os "cheiros". Psicanaliticamente falando, é a couraça que montei ao meu redor para só ver o que meu coração quer enxergar, ou seja, faço tudo para ser feliz. E estou conseguindo essa façanha com enorme sucesso e muita facilidade. Dou ao dia as cores que mais me agradam. Em minha vida, há muitos ganhos e raríssimas perdas.Essas, deleto.(A isso se chama sabedoria, com laivos de hereditariedade, porque heroína só há em livros.)
    Obrigada pela bela amizade e incentivos contantes.
    Um abraço.

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  3. Arlete diante da tua "surpresa" recorri ao nosso Albert Einstein que escreveu "Pode ser que um dia deixemos de nos falar...mas,enquanto houver amizade,faremos as pazes de novo.Pode ser que um dia o tempo passe...mas se a amizade permanecer,um de outro se há de lembrar.Pode ser que um dia nos afastemos...mas se formos amigos de verdade,a amizade nos reaproximará".Lindo e verdadeiro.Abraços

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  4. Amigo:
    Volta aqui amanhã e terás a resposta a essa excelente definição e da importância de se cultivar uma bela amizade.
    Um abraço.

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