quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

A síndrome do ninho vazio


Quando os meus filhos começaram a alçar voos em busca de novos encaminhamentos para suas vidas através dos estudos em outra cidade, fiquei apaziguada, pois sabia de seu retorno a cada fim de semana. Voavam para estudar, procurar o crescimento individual. Aninhava-me nas palavras de Gibran Khalil Gibran, lia e relia os versos do poeta árabe e me conformava.

Cheguei a memorizar todo o Profecia dos filhos
. Esse poema continha as palavras de que necessitava para abrandar a saudade que eu sentia das minhas crianças (para as mães, em desejo inconsciente de que os filhos não cresçam, os seus jamais deixam de ser crianças...):

Vossos Filhos, não são vossos filhos
São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.
Eles vêm através de vós, mas não em vós,
e embora vivam convosco, não vos pertencem...

Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos.
Porque eles têm seus próprios pensamentos.
Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas;
pois suas almas moram na mansão do amanhã,
que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho.

Podeis esforçar-vos por ser como eles,
mas não por fazê-los como vós.
Por que a vida não anda para trás e
não se demora com os dias passados.

Vós sois os arcos dos quais vossos filhos
são arremessados como flechas vivas.
O arqueiro mira o alvo na senda do infinito
e vos estica com toda sua força para
que suas flechas se projetem rápidas e para longe.

Que vosso encurvamento na mão do arqueiro seja vossa alegria.
Pois assim como ele ama a flecha que voa,
também ama o arco que permanece estável.

Lia e relia...

O tempo foi passando e a espera dos fins de semana se transformou em expectativa de encontros em feriados, em férias. Subitamente, o espaço de cada um estava desocupado. Foram saindo aos poucos, inversamente: primeiro a caçula, depois o do meio, por último , o mais velho. Foi então que entendi a enormidade devastadora da "Síndrome do ninho vazio"! Uma casa, antes plena de risos, de bagunça, de festas, de amigos que iam e vinham, ficou tristemente vazia, calada. Tudo nela choramingava, denunciava a falta deles.
Aos poucos, fui introjetando em minha mente (meus filhos, não são meus filhos. São os filhos e a filha da ânsia da vida por si mesma. Eu sou apenas o arco do qual meus filhos são arremessados como flechas vivas.) Mesmo assim, ainda ficava o questionamento: o que fazer para aceitar a partida deles? Trabalhar mais ainda? Encher meus dias, desgastar-me para, cansada, adormecer?

O tempo, esse senhor da vida e da morte, só ele é capaz de amenizar as saudades e fazer com que se passe a aceitar a ausência de quem se ama. Existem muitas formas de se canalizar o afeto aprisionado, a falta dos filhos e imaginá-los presentes. O maior paliativo, no entanto, era, ainda, as palavras de Gibran (Que meu encurvamento na mão do arqueiro seja minha alegria.Pois assim como ele ama a flecha que voa, também ama o arco que permanece estável).

Passados os anos, num dia de muita tristeza, decidi mudar tudo na casa. Redecorei-a, mudei a cor das paredes, coloquei nelas quadros novos, espelhos para reduplicar espaços, troquei móveis, reciclei outros, confeccioinei colchas, almofadas, adornos, recontruí cozinha e banheiro. Surgiu uma casa acolhedora, ficou mais
bonita, chique, moderna, cheia de atrativos para o olhar.

Diferente da morada da infância dos meus meninos, mas continua a reproduzir a essência deles, os risos, a ânsia de vida, o vaivém...
Não é mais a mesma, mas continua um lar com alma, sempre de portas abertas para acolhê-los. Não deixou de ser a casa deles, sempre à espera de sua chegada para preencher os ninhos, a qualquer momento, por isso permanece feliz...

5 comentários:

  1. Arlete repassando as tuas postagens me encantei com este artigo tão cheio de sentimentos e mesmo que talvez não respondas,quero dizer que adorei,colocastes exatamente como todos nós vivemos esta dificuldade de suportar a distância dos filhos,muitas vezes tão longe que sómente indo de avião para abraçar e demonstrar a nossa saudade.Parabéns mais uma vez.

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  2. Amigo:
    Quando resolvi criar este blog, as recomendações do meu filho que o formatou eram:fazer sempre nova postagem. Diversificar os conteúdos. Falar com o coração e, mais impertante, não deixar de responder aos comentários. Segundo ele , quem se encoraja e comenta, deseja ler uma resposta. Mesmo pq. existe um programa que me avisa da "chegada" de todos os comentários. Só não respondo imediatamente porque o tempo, às vezes, fica pequeniniiiiinho...
    Lembra-te: Nossos filhos "embora vivam convosco, não nos pertencem."
    Ainda bem que os aviões, no Brasil, no mínimo, voam...
    Abraços.
    Arlete

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  3. Estás acompanhando o que escrevo sobre a infância dos meus filhos?
    Tudo verdade ipsis littera...

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  4. Olá Arlete,
    Estava procurando alguma coisa que me falasse sobre a síndrome do ninho vazio e encontrei seu blog. Seu texto fala tudo, o poema de Gilbran, a imagem que usou e a maneira que expressou sua tristeza, tudo me emocionou. Talvez porque estou sentindo a mesma coisa que você sentiu quando eles saíram. Hoje minha caçula baterá asas e eu, bem, eu.........estou chorando....simples assim! Tê-los por perto é a melhor coisa do mundo, mas chega um momento que eles querem alçar voo e a gente descobre que não são nossos. Meu consolo é que ainda tenho um comigo e nós partilhamos nossa solidão, que não é tanta, pois temos um ao outro e cuidamos um do outro!
    Bjs Arlete, vou continuar lendo seu blog!

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  5. Oi, Alcione!

    Realmente, a sensação que se apossa dos pais, creio que de forma mais redundante nas mães, é um sentimento quase palpável. O que se apresnta é uma dor difícil de ser apaziguada,como se o tempo parasse e a única coisa resultante é a ausência dos filhos. Este abranda a falta de nossos meninos em casa, mas...

    Volta sempre.

    Um abraço.

    Arlete

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