Palavras ao Vento é fruto de uma necessidade interior de corrigir deslizes orais ou escritos, presenciados no cotidiano; mostrar a urgência de se fazer da educação prioridade nacional; discorrer sobre trivialidades, mostrando o porquê disso ou daquilo e destacar a força que a palavra tem naqueles que captam o sentido das entrelinhas.
terça-feira, 12 de janeiro de 2010
O verbo ter e o sujeito
Coitado do verbo ter! De tão mal empregado até já ganhou um sujeito. Não! Não é amante, amigo, pessoa. É sujeito simples mesmo!
Quando alguém me pergunta se uma fala está certa ou errada, respondo que depende do contexto. Se alguém disser "hoje tem recital na Academia Brasileira de Letras", certamente que cabelos em pé ficarão. Naquele templo que de imortal só leva a fama, a preservação da língua culta e do seu bom uso é uma obrigação.
Lá, o usuário do idioma luso, que cultíssimo também deve ser, deverá, obrigatoriamente, afirmar: "Hoje, há recital na Academia (com maiúscula e toda a pompa!)
Agora, se uma adorável e dedicada professorinha das séries iniciais escrever, caprichosamente, no quadro verde: Hoje tem sol!, os ânimos ficarão apaziguados. No entanto, se tivesse escrito: "Hoje há sol!" a criançada é que ficaria com os cabelinhos arrepiados.
Onde pretendo chegar? Ao ínicio de meu "falatório" quando dualizei fala e contexto. Não se vai de camisa e bermudas a uma festa de gala. Em oposição, o estádio de futebol exige roupas despojadas. Assim acontece com a fala e a escrita.
Já imaginaram deixar um bilhete na geladeira para a doméstica, se esta não for letrada, escrito deste jeito: "Relatar-me-ás, amanhã, a respeito da postura e dos enfrentamentos por ti sofridos por parte de meus rebentos! " Coitada! Achará que é linguagem de ETs.
Traduzinho e inserindo no contexto o verbo TER, uma professora lingou-me questionando se o verbo ter tinha sujeito em " Tem gente que ama e odeia ao mesmo tempo".
Uma colega jurava de pés juntos que gente era o sujeito simples dessa oração e que a construção frasal estava errada! Partia daquela regrinha básica:" antes de procurar o objeto, ACHE o sujeito", fazendo a pergunta QUEM É QUE TEM? Claro que a resposta seria GENTE! nesse contexto.Gente é o OBJETO DIRETO de ter. Dizia , também, que empregar ter por haver ou existir era coisa de burros.
Corro em defesa da questionante. O verbo TER como sinônimo de HAVER e EXISTIR é SEMPRE impessoal e, por isso, NÃO TEM SUJEITO, ou seja, essa é uma típica contrução de ORAÇÃO SEM SUJEITO ou SUJEITO INEXISTENTE (como queiram...) e, no contexto de sala de aula infantil, a frase está... CORRETÍSSIMA!
Duvidam? Corram à Novíssima Gramática de Domingos Paschoal Cegalla, 44a. edição, página 426, alínea 3.
Não têm (=possuem) essa gramática? Então "dou de graça para vocês!" (OPS! Não é o livro! É o que está escrito nele! (Não sou tão generosa assim!))
Palavras de Paschoal (até parece que esse grande gramático é meu amigo íntimo!):
3a.) Na língua popular brasileira é generalizado o uso de ter, impessoal, por haver, existir. Nem faltam exemplos em escritores modernos:
"No centro do pátio tem uma figueira velhíssima, com um banco embaixo." (José Geraldo Vieira)
"Soube que tem um cavalo morto, no quintal. " (Carlos Drummond de Andrade)
Esse emprego do verbo ter, impessoal, não é estranho ao português europeu: "É verdade. Tem dias que sai ao romper de alva e recolhe alta noite, respondeu Ângela." (Camilo Castelo Branco) [Tem = Há], termina Paschoal.
Resumindo, se até os eruditos empregam o ter por haver, por que a mestrinha não poderá fazê-lo e nós, míseros mortais?
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