Quando os meus filhos vêm me visitar e depois vão embora, instala-se uma estranha sensação de vazio como se uma parte houvesse sido tragada, retirada, à força, de mim. Então, surge a vontade de fazer coisas inusitadas e de que detesto realizar. Cozinhar é uma dessas atividades que, se dependesse de mim, não existiria.
No entanto, quando os filhos voltam para as suas e esta casa fica vazia, encho-a de flores e as contemplo como se me fossem ofertadas pelos meus rebentos. Apaziguada, volto às atividades de rotina, sem deixar de ter em mente as surpresas que proporcionarei a eles em próximas visitas.
Esperas compensadas pela chegada mesmo que próxima a partida. Abraços que se fundem com a saudade. Palavras para serem ditas, guardadas ou esquecidas, se ofensivas, abortadas no âmago da boca. Lábios que acariciam e deixam na pele do beijado o agreste sabor e cheiro do mel. Mãos que se apertam e se descolam cientes do reencontro. Assim é a vida, repleta de encontros e desencontros, lágrimas, sorrisos e saudades.
Hoje, numa gélida manhã de inverno, a vontade de abraçar e acariciar os meus amores distantes se pontua e se intensifica. Mesmo sabendo que estão bem, curtindo os seus amores e vivendo, com tudo o que lhes é de direitos, as suas vidas. No entanto, ao sentir a saudade rondando e o aperto estranho no coração fazer-me questionar: valerá a pena ficar tanto tempo longe deles?
Afirmativa é a resposta porque, ao me encontrar com eles, o afeto reduplica e o querer ser melhor, mais delicada, atenta e companheira também se multiplica. Quem sabe a presença constante, o zelo desmedido e, tantas vezes, irritante, mataria o encanto?
A certeza congela afetos e os torna menos interessantes. A dúvida do que poderia ser ou como se faria isto ou aquilo é um dos grandes paliativos dessa etapa enigmática que é viver e deixar viver os que amamos. Para isso fomos feitos, como nos versos de Vinícius de Moraes abaixo.
Poema de Natal
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Lindo amiga!
ResponderExcluirQuerida! Obrigada.
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