O texto abaixo, escrevi em tempo recorde para enviar ao jornal EXPRESSO ILUSTRADO. Depois que reli, gostei.
Redenção
Hoje acordei com alma de
brisa, sedenta por perfume de flores, desejo de comer bergamotas para deixar o
sumo de meus erros evaporarem ao sol. Acordei com os olhos cheios de infância
para correr na chuva, andar pelas sarjetas, tecer cascatas nas águas
acumuladas. Acordei sequiosa de abraços bem apertados, saudosa dos beijos que
não dei, das carícias sonegadas, dos segredos que não compartilhei, da
gargalhada que retive. Acordei com fome de justiça para tornar mais reais os
sonhos que deixei de sonhar, esquecer os dias inúteis, as palavras ferinas, os
dedos em riste, as acusações sem sentido.
Acordei com muita pressa porque
preciso pedir perdão por coisas que nem fiz, não por falta de vontade, mas, comedida
e em tempo, abortei a intenção.
Com borracha poderosa,
quero apagar o tempo perdido com coisas inúteis, reuniões sem sentido, tardes desperdiçadas
em busca do nada, tarefas malfeitas, ofensas praticadas e recebidas. Com os
olhos bem abertos, vou avolumar as asas dos devaneios porque percebi que
envelhece mais rápido, quem deixa de sonhar ou torna diminutos os sonhos.
Plantarei mais flores, dedilharei mais poemas, recitarei versos ao vento para
alimentar a alegria e para certificar-me de que ainda detenho o poder sobre o
que penso, ainda articulo com perfeição as palavras e escuto até as lamúrias do
vento. Assim, encantada com a vida, em paz com meus fantasmas, ciente de que
ainda tenho coisas a realizar, poderei dormir o sono dos justos e acordarei com
mais vontade de viver.